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TCU terá nova ferramenta de inteligência artificial capaz de ler e redigir despachos

O Consórcio NeuralMind Terranova, formado pelas empresas NeuralMind Inteligência Artificial S/A e Terranova Consultoria Estatística Ltda., venceu uma licitação para desenvolver um novo sistema de inteligência artificial para o Tribunal de Contas da União (TCU).

O objetivo da concorrência, que teve edital aberto em janeiro de 2022, era contratar um serviço automatizado com tecnologia para acelerar os processos burocráticos do órgão de controle orçamentário, e que fosse capaz de ler, interpretar e resumir documentos, além de sugerir ações a partir deles, além de redigir textos como manifestações e despachos.

O projeto vencedor da licitação propõe o uso da tecnologia GPT3 (que é diferente do Chat GPT) para cumprir tarefas burocráticas e mais repetitivas dentro do processo de encaminhamento de denúncias.

“A inteligência artificial vai auxiliar muito o TCU não só ao encaminhar mais rapidamente a parte burocrática dos procedimentos, mas também em responder com entregas mais rápidas para a sociedade. Com a ajuda da tecnologia, o órgão consegue julgar mais rápido e ser mais efetivo, com menos número de erros por interferência humana, em benefício de toda a sociedade”, explica ao JOTA Marcelo Guedes Nunes, advogado, pesquisador, diretor da Associação Brasileira de Jurimetria e sócio da Terranova.

A ferramenta está em fase avançada de testes, mas ainda não tem data prevista para ser implantada. Na proposta enviada ao edital, o consórcio NeuralMind Terranova estima que “o desenvolvimento tecnológico desta solução ocorrerá em um prazo de até 30 meses, a contar da data de assinatura do contrato”, o que acontecerá nos próximos dias.

O investimento necessário para o seu desenvolvimento totaliza pouco mais de R$ 6,1 milhões, ainda segundo previsão do consórcio. Mas, em contrapartida, o TOU informou ao JOTA que prevê economizar mais de R$ 10 milhões ao ano, graças a ganhos de eficiência que devem gerar redução de custos e maior celeridade aos processos internos do órgão.

Além disso, calcula que a adoção da plataforma renderá um benefício à sociedade de R$ 100 milhões por ano, decorrentes das irregularidades sanadas com a ajuda da tecnologia.

Como funcionará a plataforma

Antes de entrar no funcionamento da ferramenta, vale ressaltar que o TCU é um órgão de controle externo do governo que presta auxílio à sociedade e ao Congresso no acompanhamento da execução orçamentária. Ou seja, avalia se o dinheiro público está
sendo bem gasto, se medidas estão sendo cumpridas, e recebe denúncias de corrupção, desvios, mau uso de verbas públicas. É nesse último que deve entrar a inteligência artificial
desenvolvida pelo consórcio NeuralMind Terranova.

“É uma grande ferramenta com inteligência artificial e uso generativo de linguagem natural, ou seja, uma ferramenta capaz de ler, resumir documentos, propor soluções e devolver textos redigidos automaticamente baseados nessas soluções”, explica Marcelo Guedes Nunes.

“Nós já conhecíamos o GPT3 e, pelo perfil da licitação, entendemos que essa era uma ótima oportunidade de usar essa ferramenta que ninguém conhecia”, acrescenta. Esse, aliás, foi um dos fatores que desempatou a concorrência e fez da dupla NeuralMind Terranova a vencedora da licitação. No resultado da seleção, o TCU afirma reconhece que “embora recente, a rota [se referindo ao GPT3] é a aposta de grandes players do mercado, como Nvidia, Google, Microsoft e OpenAl, que investem vultosas quantias na criação de
modelos para servirem aos mais diversos clientes e aplicações”.

A ferramenta, no entanto, funciona de forma muito diferente do chat GPT, bot capaz de gerar de maneira automatizada textos customizados com os mais variados propósitos, e tem sido assunto recorrente no noticiário tecnológico nos últimos meses.

Nunes explica que enquanto o chat GPT tem um código fechado, ou seja, que não pode ser alterado, existem versões de outras ferramentas GPT3 com código aberto e, que podem ser personalizadas para necessidades específicas. “Quando a gente usa versões comerciais, como o chat GPT, recebe respostas relativamente boas, mas ele também tem certas associações erradas que geram o que chamamos de alucinações. Entendemos que a nossa ferramenta não poderia alucinar, porque estamos lidando com processos muito
sérios. Por isso, propusemos soluções para especializar a ferramenta e ter uma ocorrência de erros muito reduzida”

Além de “treinar” o GPT3 para executar tarefas muito específicas ligadas aos processos do TCU, o consórcio também alia outras ferramentas -de resumo, de conversão de documentos- em uma só plataforma, que está em fase avançada de testes. Isso também
chamou atenção do TCU na licitação, que afirmou: “a rota proposta pelo Projeto NeuralMind TerraNova não requer treinamento de vários modelos, mas o refino de um único mega modelo através de procedimentos como os de engenharia de prompts, cujo conhecimento se aparenta mais fácil de ser transferido ao corpo técnico do TCU”.

“Na prática, a nossa plataforma tenta replicar o pensamento que um escritório geralmente teria, mas com a inteligência artificial: ler um documento, entendê-lo, pensar numa estratégia e redigir documentos. É exatamente isso que a plataforma faz”, resume o pesquisador.

Tecnologia pode colocar empregos em risco?

Apesar de “replicar o que o pensamento humano faria”, Nunes nega que a adoção de uma plataforma de inteligência artificial como essa possa substituir a ação humana no TCU ou colocar postos de trabalho em risco.

Ele enumera três fatores para explicar por que essa é “uma leitura incompleta e precipitada”: “Primeiro, quando você tem ganho de eficiência no processo, ele tende a ser mais utilizado. Ou seja, se a gente torna o funcionamento do TCU mais eficiente, isso abre espaço para que ele seja mais efetivo nas denúncias e as pessoas se sintam mais incentivadas a denunciar, gerando um aumento de demanda. Segundo, tudo que a ferramenta faz não dispensa supervisão humana. Quem toma decisões não é a máquina, é a inteligência humana. E terceiro, ainda que sobre tempo para quem está alocado, esse tempo poderá ser dedicado a atividades mais nobres. Se você automatiza as etapas administrativas, as demandas podem ser melhor analisadas e pessoas podem dedicar mais horas à análise de cada processo”, ou seja, funcionários tendem a passar menos tempo desempenhando funções mecânicas e mais tempo em atividades intelectuais, “o que dignifica os funcionários e aumenta a qualidade do produto final”, acredita o pesquisador.

Em nota enviada ao JOTA, o TCU também garantiu que toda ação da tecnologia depende da inteligência humana e que, por isso, não ameaça postos de trabalho. “As soluções de inteligência artificial reduzem o tempo de atividades repetitivas ou mecânicas relacionadas ao trabalho intelectual, mas não são capazes de emitir juízos de valor. A análise e a conclusão sobre os fatos identificados são tarefas exclusivas dos auditores; nunca da máquina”.

Órgãos públicas que usam Inteligência Artificial ainda são exceção

Na avaliação de Nunes, “é preciso fazer um elogio ao TCU, que está muito atualizado e preocupado em ser a franja no uso das melhores tecnologias para desempenho de suas funções. A gente tem uma visão atrasada do Estado, mas tem frentes de governo que estão mais avançadas que a iniciativa privada”.

De acordo com um levantamento do próprio TCU, mais de um terço (38%) das organizações federais não utilizam e nem planejam utilizar inteligência artificial em seus processos. Outro terço (33,5%) conversa internamente sobre essa possibilidade, mas de modo ainda muito especulativo.

Apenas 3,4% do total já está de fato expandindo para novos projetos de IA -caso do Tribunal de Contas da União, que usa inteligência artificial há pelo menos cinco anos e que, além de ter firmado contrato com o consórcio NeuralMind TerraNova para implementar a tecnologia de inteligência artificial desenvolvida a partir do chat GPT3, atualmente conta com seis sistemas inteligentes para extração e análise de dados, a maioria desenvolvida internamente por seus próprios auditores.

Fonte: JOTA

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